Ferramentas de análise de comportamento tático no futebol
(FAPESP processo número 2016/50250-1 e
2017/20945-0)
A
análise objetiva de um determinado esporte exige o desenvolvimento de diversos
procedimentos metodológicos capazes de detectar e codificar o maior número de
informações disponíveis durante uma partida ou competição. Dessa forma, há uma
constante busca por ferramentas capazes de identificar, compreender e analisar
o desempenho de atletas e equipes durante jogos e competições, com o propósito
de aumentar a possibilidade de sucesso na referida modalidade esportiva,
independente do nível de prática, habilidade ou experiência. Para uma análise
quantitativa do desempenho de atletas durante situações de competição e
treinamento, diversas metodologias foram desenvolvidas com o principal objetivo
de identificar a posição do jogador em campo em função do tempo. Determinada
sua posição permitiu, a priori, a
quantificação de variáveis físicas do desempenho dos atletas, como distâncias
percorridas e velocidades.
Mais
recentemente, a literatura específica começou a apresentar modelos que, a
partir das coordenadas bidimensionais dos atletas, pudessem representar as
características táticas das equipes. Sendo assim, a partir das trajetórias dos
jogadores ao longo de toda partida, estudos passaram a representar graficamente
o sistema de jogo que as equipes adotavam na competição. Inicialmente, essa
representação foi realizada por vetores ortogonais definidos a partir de uma
Análise por Componentes Principais (Figura 1A). Nos últimos anos, esta
representação deu lugar aos gráficos popularmente conhecidos como 'heatmaps' ou
mapas de calor (Figura 1B). Um ponto a ser destacado é que, durante a Copa do
Mundo de 2018, o site da FIFA tem disponibilizado os mapas de calor de todos os
atletas em campo, permitindo a compreensão dos sistemas de jogo adotados por
todas as equipes durante a competição.
Figura
1 - Representação da trajetória dos jogadores em campo.
Uma
vez que a posição de todos os jogadores em campo é conhecida a cada instante de
tempo, análises sobre como atletas se distribuem em campo têm sido realizadas e
associadas às ações de sucesso e fracasso ofensivos e defensivos durante a
partida. Uma das formas de se analisar como esses jogadores estão distribuídos
é baseada no cálculo da área de ocupação da equipe, ou seja, o espaço do campo
que a equipe cobre com seus jogadores, em cada instante de tempo de jogo
(Figura 2A). A partir das posições de cada jogador em campo, define-se o
envoltório convexo da equipe, definido como o menor polígono e contém todos os
atletas de uma mesma equipe. Além da área de ocupação, medidas de proximidade e
afastamento entre os jogadores de uma mesma equipe representam a capacidade da
equipe em se organizar adequadamente em campo. Para isso, distâncias são
calculadas entre todos companheiros de equipe a cada instante de tempo, e
permitem inferir o quão compacto a equipe atua durante as partidas (Figura 2B).
Tanto a área de ocupação quanto as medidas de proximidade têm mostrado relação
com o sucesso durante as partidas. Por exemplo, equipes sofrem mais
finalizações a gol quando não estão compactadas o suficiente.
Figura 2. Representação da organização dos jogadores em campo por meio da área de ocupação e medidas de compactação.
Nos
últimos anos, devido ao grande volume de dados gerados durante as partidas e a
necessidade de capturar os elementos essenciais que determinam o sucesso no
futebol, pesquisas na área de Ciência da Computação têm sido direcionadas ao
desenvolvimento de ferramentas fundamentadas nos conceitos de redes neurais
complexas, mineração de dados e aprendizagem de máquina. Por exemplo, uma
análise mais aprofundada da forma do polígono e sua complexidade por meio de
técnicas de dimensão fractal pode gerar informações adicionais sobre as
estruturas táticas da equipe e, principalmente, se essas características estão
relacionadas a eventos importantes da partida. Além disso, a partir das coordenadas
bidimensionais de companheiros de equipe e adversários, torna-se possível
estimar a complexidade da tomada de decisão para a realização de passes. A
ideia é pautada na teoria de grafos. Os jogadores são modelados como vértices,
enquanto as arestas que ligam os jogadores são definidas a partir de uma
possível interação entre eles. Assim, caso um companheiro de equipe esteja
marcado, ou exista um adversário entre eles, a possibilidade de interação entre
os mesmos é removida, e consequentemente a aresta também. Deste modo, a cada
instante de tempo pode-se calcular qual a complexidade da realização de um
passe em função dos companheiros de equipe que estão disponíveis.
Figura
3. (a) Gráfico de Triangulação de Delaunay da equipe A (jogadores 1 a 11), com
vértices representando jogadores e arestas representando o possível fluxo de
passes. (b) Observação da localização dos jogadores adversários. Vértices
amarelos e vermelhos (oponentes) podem bloquear passes, ou seja, passes entre
jogadores da equipe A, que estão próximos aos adversários, são menos prováveis
de acontecer. (c) Gráfico resultante após remoções de bordas.
Uma
breve ilustração de como algumas dessas ferramentas são utilizadas para a
representação da dinâmica do jogo pode ser visualizada no link abaixo.
Ferramentas
de análise de comportamento tático no futebol como as descritas acima têm
apresentado um papel fundamental para a quantificação do desempenho no futebol.
Estes resultados sugerem que incentivar
pesquisas multidisciplinares, capazes de combinar a expertise de cada área –
como Biomecânica e Ciência da Computação – constitui iniciativa promissora para
a promoção do desenvolvimento tecnológico e científico para a área da Ciência
do Esporte.
Autores: Felipe Arruda Moura, Ricardo da Silva Torres e
Sergio Augusto Cunha
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