terça-feira, 10 de julho de 2018

Biomecânica aplicada ao futebol - Copa do Mundo de Futebol de 2018: Ferramentas de análise de comportamento tático no futebol


Ferramentas de análise de comportamento tático no futebol

(FAPESP processo número 2016/50250-1 e 2017/20945-0)


     A análise objetiva de um determinado esporte exige o desenvolvimento de diversos procedimentos metodológicos capazes de detectar e codificar o maior número de informações disponíveis durante uma partida ou competição. Dessa forma, há uma constante busca por ferramentas capazes de identificar, compreender e analisar o desempenho de atletas e equipes durante jogos e competições, com o propósito de aumentar a possibilidade de sucesso na referida modalidade esportiva, independente do nível de prática, habilidade ou experiência. Para uma análise quantitativa do desempenho de atletas durante situações de competição e treinamento, diversas metodologias foram desenvolvidas com o principal objetivo de identificar a posição do jogador em campo em função do tempo. Determinada sua posição permitiu, a priori, a quantificação de variáveis físicas do desempenho dos atletas, como distâncias percorridas e velocidades.
      Mais recentemente, a literatura específica começou a apresentar modelos que, a partir das coordenadas bidimensionais dos atletas, pudessem representar as características táticas das equipes. Sendo assim, a partir das trajetórias dos jogadores ao longo de toda partida, estudos passaram a representar graficamente o sistema de jogo que as equipes adotavam na competição. Inicialmente, essa representação foi realizada por vetores ortogonais definidos a partir de uma Análise por Componentes Principais (Figura 1A). Nos últimos anos, esta representação deu lugar aos gráficos popularmente conhecidos como 'heatmaps' ou mapas de calor (Figura 1B). Um ponto a ser destacado é que, durante a Copa do Mundo de 2018, o site da FIFA tem disponibilizado os mapas de calor de todos os atletas em campo, permitindo a compreensão dos sistemas de jogo adotados por todas as equipes durante a competição.


 

Figura 1 - Representação da trajetória dos jogadores em campo.


     Uma vez que a posição de todos os jogadores em campo é conhecida a cada instante de tempo, análises sobre como atletas se distribuem em campo têm sido realizadas e associadas às ações de sucesso e fracasso ofensivos e defensivos durante a partida. Uma das formas de se analisar como esses jogadores estão distribuídos é baseada no cálculo da área de ocupação da equipe, ou seja, o espaço do campo que a equipe cobre com seus jogadores, em cada instante de tempo de jogo (Figura 2A). A partir das posições de cada jogador em campo, define-se o envoltório convexo da equipe, definido como o menor polígono e contém todos os atletas de uma mesma equipe. Além da área de ocupação, medidas de proximidade e afastamento entre os jogadores de uma mesma equipe representam a capacidade da equipe em se organizar adequadamente em campo. Para isso, distâncias são calculadas entre todos companheiros de equipe a cada instante de tempo, e permitem inferir o quão compacto a equipe atua durante as partidas (Figura 2B). Tanto a área de ocupação quanto as medidas de proximidade têm mostrado relação com o sucesso durante as partidas. Por exemplo, equipes sofrem mais finalizações a gol quando não estão compactadas o suficiente.







Figura 2. Representação da organização dos jogadores em campo por meio da área de ocupação e medidas de compactação.

      Nos últimos anos, devido ao grande volume de dados gerados durante as partidas e a necessidade de capturar os elementos essenciais que determinam o sucesso no futebol, pesquisas na área de Ciência da Computação têm sido direcionadas ao desenvolvimento de ferramentas fundamentadas nos conceitos de redes neurais complexas, mineração de dados e aprendizagem de máquina. Por exemplo, uma análise mais aprofundada da forma do polígono e sua complexidade por meio de técnicas de dimensão fractal pode gerar informações adicionais sobre as estruturas táticas da equipe e, principalmente, se essas características estão relacionadas a eventos importantes da partida. Além disso, a partir das coordenadas bidimensionais de companheiros de equipe e adversários, torna-se possível estimar a complexidade da tomada de decisão para a realização de passes. A ideia é pautada na teoria de grafos. Os jogadores são modelados como vértices, enquanto as arestas que ligam os jogadores são definidas a partir de uma possível interação entre eles. Assim, caso um companheiro de equipe esteja marcado, ou exista um adversário entre eles, a possibilidade de interação entre os mesmos é removida, e consequentemente a aresta também. Deste modo, a cada instante de tempo pode-se calcular qual a complexidade da realização de um passe em função dos companheiros de equipe que estão disponíveis.


 



Figura 3. (a) Gráfico de Triangulação de Delaunay da equipe A (jogadores 1 a 11), com vértices representando jogadores e arestas representando o possível fluxo de passes. (b) Observação da localização dos jogadores adversários. Vértices amarelos e vermelhos (oponentes) podem bloquear passes, ou seja, passes entre jogadores da equipe A, que estão próximos aos adversários, são menos prováveis de acontecer. (c) Gráfico resultante após remoções de bordas.

     Uma breve ilustração de como algumas dessas ferramentas são utilizadas para a representação da dinâmica do jogo pode ser visualizada no link abaixo. 


 O vídeo também pode ser acessado clicando aqui.


Ferramentas de análise de comportamento tático no futebol como as descritas acima têm apresentado um papel fundamental para a quantificação do desempenho no futebol.  Estes resultados sugerem que incentivar pesquisas multidisciplinares, capazes de combinar a expertise de cada área – como Biomecânica e Ciência da Computação – constitui iniciativa promissora para a promoção do desenvolvimento tecnológico e científico para a área da Ciência do Esporte.


 


Autores: Felipe Arruda Moura, Ricardo da Silva Torres e Sergio Augusto Cunha

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